A 1ª Vara de Registros Públicos de São Paulo em análise de suscitação de dúvida em procedimento extrajudicial de usucapião requerido em face do Oficial do 1º Registro de Imóveis da São Paulo, que tem por objeto parte ideal de 1/3 de imóvel, entendeu pela impossibilidade de processamento do pedido por não ser possível usucapir parte ideal de imóvel em condomínio ordinário (Processo 1080532-37.2020.8.26.0100).
No caso, o requerente já é proprietário de 1/3, requerendo usucapião de 1/3 que teria sido a ele comprometido a venda, não havendo interesse na usucapião do 1/3 restante, que seria de propriedade de seu pai. O Oficial argumenta que a posse pro indiviso representa posse sobre todo o imóvel, e não parte materialmente dividida, o que faz com que inexista posse sobre parte ideal. Além disso, diz que não há possibilidade de usucapir área de garagem coletiva, já que a vaga é descrita como indeterminada.
Segundo a VRP a usucapião é método de aquisição de propriedade derivada da posse qualificada sobre o bem por determinado período de tempo. E a posse se dá no plano fático, com o uso, gozo ou fruição (exercício de um dos poderes inerentes à propriedade, conforme Art. 1.196 do CC) sobre área determinada, o que torna logicamente impossível o exercício de posse sobre “parte ideal” do bem. Trazendo o conceito para o presente caso, ou bem o requerente exerce posse sobre todo o apartamento utilizando-o em sua totalidade, ou mesmo locando-o por inteiro ou sobre ele não exerce posse. Não é possível dizer que o requerente exerce 1/3 de posse ou posse sobre 1/3 do bem. Levando o argumento ao extremo, já que trata-se de apartamento, seria possível a usucapião de parte do bem somente se a posse fosse exercida apenas sobre tal área, como um quarto, por exemplo, hipótese na qual tal cômodo seria destacado do imóvel, com matrícula própria em nome do possuidor, o que não se admite. A exceção seria o caso de grandes terrenos, em que há condôminos de partes ideais na matrícula e cada condômino exerce posse exclusiva sobre parte determinada do solo, o que permitiria a usucapião desta parte, abrindo-se nova matrícula em que extinto o condomínio. No geral, contudo, o condomínio, como bem lembrado pelo Oficial e pelo D. Promotor, representa posse de cada condômino sobre a totalidade do bem, apesar da divisão de propriedade em partes ideais, o que gera divisão proporcional de despesas e frutos, conforme Arts. 1.314 e seguintes do Código Civil, mas nem sempre há divisão no exercício da posse sobre partes determinadas no solo apesar da posse poder ser dividida no tempo, com o novo instituto da multipropriedade.
Ademais, por impossibilidade lógica, não é possível dizer que o requerente exerce, exclusivamente, posse sobre “parte ideal” de 1/3 do bem. Quanto a vaga de garagem, a própria imprecisão existente em sua descrição na ata notarial demonstra que não há posse exclusiva sobre área determinada no solo. Vê-se, na verdade, que pretende o requerente o reconhecimento de que, sendo proprietário de unidade autônoma no edifício, tem direito a uso a vaga indeterminada de garagem. Ocorre que tal direito não é passível de usucapião, sendo acessório a propriedade de unidade autônoma conforme convenção do condomínio edilício, já que, novamente, não há efetiva posse sobre área de garagem, mas uso de área comum em conformidade com as normas condominiais.
Fonte: DJE/SP
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