DICA DE LEITURA: “YESSICA, SOBREVIVENTE”, DE ANDERSON OLIVIERI

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A dica de hoje do jornalista Anderson Olivieri – responsável pela comunicação do Cartório de Sobradinho – é a crônica “Yessica, sobrevivente”, de sua autoria:

Yessica me mostrou que a begônia da minha casa floriu; os molares do meu filho nasceram; a Beatriz começou a escrever o seu nome completo; os dois, juntos, rabiscaram a parede da sala; e a seca, mais tarde que de costume, chegou a Brasília.

Andava tão desatento que nem mesmo percebi o evidente: se o sabor do pão piorou é porque mudou o padeiro. A Yessica quem me contou que ele trocou o estabelecimento pelo concorrente. Foi também graças a ela que me dei conta de que as jovens árvores do bosque perto de casa cresceram, e os ipês de Brasília começaram a florir roxo.

Vi que o Esdras, rapaz que lava o meu carro no estacionamento, progrediu no serviço. Já não busca mais água em baldes num prédio distante porque está equipado com uma lavadora de alta pressão. Quem também melhorou no trabalho foi o Silvano, engraxate do bairro, que agora tem ponto fixo e cadeira alta para os clientes. Notei isso tudo graças à Yessica.

Ela também me chamou a atenção para algo que acontecia debaixo do meu nariz – ou melhor, acima da minha cabeça – sem que eu percebesse: estão de volta à árvore em frente de casa os tucanos que nasceram e cresceram em seus troncos e depois sumiram. Ou será que sempre estiveram ali e o sumido era eu? Nesta semana eu os revi. Estavam faceiros, gritando, pulando de galho em galho e o tempo todo erguendo o bico amarelo e preto, tão exibidos quanto um pavão.

Espantado fiquei foi quando Yessica me mostrou que meus pais envelheceram. Já exibem rugas pelo rosto e pescoço e cabelos brancos com fartura, falam com vozes mais rouquenhas e andam com uma demora inexistente até há pouco. E como os meus sobrinhos cresceram! Um era ontem guri de colo e está quase adolescente. Foi Yessica que me despertou para o tempo que correu e fermentou as crianças da família.

Conheci Yessica faz pouco tempo. Ela é caixa do supermercado mais próximo de casa. Deve ter por volta de 55 anos. Fala um português enrolado, quase incompreensível. É venezuelana e está no Brasil há um ano. Fugiu da miséria de sua adorada Maturín, capital do estado de Monagas, deixando lá filhos e netos, os quais vivem do que ela envia quinzenalmente.

Um dia perguntei à Yessica do que sentia falta em Maturín, além dos seus amados que lá ficaram. Disse que de tudo – “mas tudo mesmo”, reforçou, destacando como exemplos de saudades o crepitar na panela da farinha de milho ao preparo da arepa e o zunido leve e sonífero presente nas noites invernosas da Venezuela.

Folgado na fila, sem cliente a pressionar a minha partida, pedi a ela que elencasse outras saudades. Ouvi que do sorveteiro que passa; da horta onde abrolham folhas e ervas; da vizinha que se debruça à janela para uma prosa; do time de beisebol que só perde; das crianças soltas no descampado do bairro; do cheiro das araguaneys, tão típicas na Venezuela; de falar e ouvir em espanhol; de cavar com o filho… E provavelmente, deduzo, de ter orgulho em saber que a terra amontoada em suas unhas é a sua terra.

Yessica, que lá vivia, aqui só sobrevive. Voltei para casa decidido a (tentar) viver.

Para acompanhar outras crônicas deste autor, visite o site www.apalavrado.com.br.

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